segunda-feira, 25 de abril de 2011

Boa Páscoa!



No filme A Paixão de Cristo (2004), esta citação retirada do Livro do Apocalipse – "Eu faço novas todas as coisas" – é colocada na boca de Jesus no momento em que tudo parece apontar precisamente para o contrário.

É surpreendente a capacidade que Jesus tem de facto para renovar e recriar a realidade, a começar pela realidade humana. Ainda que por vezes possa ser para nós desconcertante o modo que Ele encontra para o fazer.

Um dos mais conhecidos poemas portugueses fala da necessidade de "passar além da dor". Talvez porque quando esta é demasiado grande os nossos olhos podem não conseguir ver mais nada. Mas a verdade é que, em Jesus, uma outra realidade acaba por se revela ainda maior – a única que de facto tem futuro, a única que na verdade tem valor.

Com a vida e a entrega de Jesus, da qual celebramos agora o seu ponto mais extremo, tem início uma autêntica revolução interior: algo que começa a tomar conta do mundo e a recriá-lo de novo. Lenta e discretamente tantas vezes, mas de uma forma poderosa e verdadeira como nenhuma outra força seria capaz de o fazer.

A partir da sua ressurreição, novas possibilidades e insuspeitados horizontes se abrem diante de nós. Laudetur Jesus Christus! Aleluia!

quinta-feira, 14 de abril de 2011

No Campo de Refugiados de Kakuma

De Nairobi para Kakuma
Cheguei ao campo de refugiados de Kakuma na segunda-feira passada, dia 11 de Abril. Vim de avião até uma cidade chamada Lodwar que fica a uma hora e meia daqui, e depois, de Lodwar até Kakuma, de carro. Na semana anterior tinha estado no escritório regional do JRS em Nairobi, num tempo de preparação para o meu trabalho em Kakuma. Foi uma semana com muitos contactos e reuniões, e um tempo para poder conhecer um pouco as pessoas e os outros projectos que o JRS tem nesta região da África Oriental. Pude também conhecer directamente um dos projectos de apoio a refugiados que o JRS tem na cidade de Nairobi, acompanhando uma Irmã que faz visitas a casas onde se encontram refugiados, em alguns bairros pobres de Nairobi.

O Campo de Kakuma
O campo de refugiados de Kakuma fica no Rift Valey, a uns 750 km norte de Nairobi, e já próximo da fronteira com o Sudão e do Uganda. É um campo bastante antigo, vai fazer agora vinte anos (http://en.wikipedia.org/wiki/Kakuma). Há por isso pessoas neste campo que viveram grande parte da sua vida aqui – alguns até nasceram e cresceram neste campo.

O Quénia tem sido nos últimos anos um País bastante estável e pacífico (tiveram problemas na sequência das eleições de 2007, mas felizmente não demorou muito a que fossem ultrapassados). À volta do Quénia, porém, quase todos os Países vizinhos têm tido (e continuam actualmente a ter) problemas bastante sérios, nomeadamente de instabilidade e de guerra civil, muitas vezes com violência exercida directamente sobre as populações civis. O campo de Kakuma conta por isso, neste momento, com mais de 80.000 refugiados, provindos de vários Países vizinhos (e alguns até não adjacentes ao Quénia). A maior parte dos refugiados que se encontram em Kakuma vieram do Sudão, Somália, Etiópia e Eritreia, Rep.Democrática do Congo, Uganda, Ruanda e Burundi. Mas há também um número considerável de pessoas provindas de outros Países. Nos tempos mais recentes, tem sido sobretudo da Somália que têm chegado a maior parte dos refugiados (e continuam a chegar).

Em Kakuma trabalham varias agências da Nações Unidas, bem como um número de organizações não governamentais, entre as quais o JRS (uma das mais pequenas, por sinal). O governo do Quénia também está presente, sendo a polícia queniana responsável pela segurança no campo.

Dadaab
Pelo que me disseram, no Quénia, mais próximo da fronteira com a Somália, há um outro campo que neste momento tem uma população de refugiados bem maior do que Kakuma. Chama-se Dadaab, (http://en.wikipedia.org/wiki/Dadaab). Dadaab terá actualmente mais de 300.000 refugiados. E este número continua a aumentar, devido ao contínuo fluxo de pessoas que continuam a ter de fugir da Somália. Inclusivamente, alguns dos refugiados da Somália que estão agora aqui em Kakuma estiveram inicialmente em Dadaab, tendo sido mais tarde trazidos para aqui pelo ACNUR (Alto Comissariado das Nações Unidas para os Refugiados), por Dadaab não ter mais capacidade para os receber.

A Comunidade do JRS
Quanto à casa para onde vim morar, faz parte de uma comunidade do JRS composta por uma dúzia de pessoas: outros três jesuítas, uma Irmã e vários voluntários ou contratados leigos. É uma comunidade com uma média etária baixa e com pessoas vindas de diversos Países: Austrália, Estados Unidos, Canada, Alemanha, Áustria, Republica Checa e, claro, Quénia.

Em http://maps.google.com/, introduzindo as coordenadas 3.71222, 34.858037, com a vista de satélite dá para ver a casa onde estou agora (tem um pequeno pátio interior). A equipa do JRS mora em três casas diferentes, todas próximas umas das outras. Uma das outras casas do JRS fica mesmo ao lado da minha, mas na altura em que estas fotos do google foram tiradas ainda não tinha sido construída. Por outro lado, também o próprio campo de refugiados está agora já maior.

O Panorama

Como se pode ver, as nossas casas ficam numa das extremidades sul do campo, e junto ao leito, bastante largo, de um rio. A maior parte do tempo esse leito está seco: enche-se apenas ocasionalmente, quando há chuvas nas montanhas do Uganda. E nessa altura a água passa então em grande quantidade por Kakuma. Mas são poucos os dias do ano em que isso acontece. Logo do outro lado do leito existe uma pequena povoação de habitantes locais – não refugiados, portanto – chamados Turcanas (o mesmo nome dado a um grande lago que existe a pouco mais de cem quilómetros a leste de Kakuma). Pelo que me disseram, e apesar de parecer algo estranho, os Turcanas são ainda mais pobres do que os próprios refugiados.

A partir das imagens satélite dá também para perceber que a paisagem aqui é um pouco desértica. De facto, não estamos muito longe do Saara. O clima é por isso bastante quente e seco (talvez não muito diferente do nosso Alentejo, aí pelo mês de Agosto). Apesar de ser quase deserto, a paisagem parece-me bastante bonita, com montanhas mais altas à volta e com o céu à noite cheio de estrelas.

É tudo por agora. Numa próxima oportunidade, espero poder publicar fotos daqui e descrever um pouco o meu trabalho no campo.